segunda-feira, 23 de março de 2015

FAMÍLIA ESPIRITUAL (do blog: licoesdosespiritos.blogspot.com.br)

 Família Espiritual

Nosso núcleo familiar consanguíneo é o primeiro agrupamento em que nos compete fazer o Bem. Mas não é o único, pois nossa família é a Humanidade inteira.

O Dicionário Aurélio define que família diz respeito a laços de parentesco. Contudo, não restringe o conceito a este tipo de afinidade: estipula que, por extensão, família significa “grupo de indivíduos que professam o mesmo credo, têm os mesmos interesses, a mesma profissão, são do mesmo lugar de origem etc.” [1].

Jesus explica o conceito de família espiritual na passagem do Evangelho de Mateus, capítulo 12, versículos 46 a 50:
“Enquanto ele ainda falava à multidão, a mãe e os irmãos dele estavam de fora, procurando falar-lhe. E alguém disse-lhe: ‘olha, tua mãe e teus irmãos estão lá fora e procuram falar-te’. Mas ele respondeu ao que lhe falava: ‘quem é minha mãe e quem são meus irmãos’? E estendendo a mão para seus discípulos, disse: ‘Eis minha mãe e meus irmãos; porque aquele que fizer a vontade de meu Pai que está nos céus, esse é meu irmão, irmã e mãe!’”
Allan Kardec, o Codificador da Doutrina Espírita, no Capítulo XIV de “O Evangelho Segundo o Espiritismo”, assim analisa esta passagem evangélica:
“Os que encarnam numa família, sobretudo como parentes próximos, são, as mais das vezes, Espíritos simpáticos, ligados por anteriores relações, que se expressam por uma afeição recíproca na vida terrena. Mas, também pode acontecer sejam completamente estranhos uns aos outros esses Espíritos, afastados entre si por antipatias igualmente anteriores, que se traduzem na Terra por um mútuo antagonismo, que aí lhes serve de provação. Não são os da consanguinidade os verdadeiros laços de família e sim os da simpatia e da comunhão de ideias, os quais prendem os Espíritos antes, durante e depois de suas encarnações. Segue-se que dois seres nascidos de pais diferentes podem ser mais irmãos pelo Espírito, do que se o fossem pelo sangue. Podem então atrair-se, buscar-se, sentir prazer quando juntos, ao passo que dois irmãos consanguíneos podem repelir-se, conforme se observa todos os dias: problema moral que só o Espiritismo podia resolver pela pluralidade das existências. (Cap. IV, nº 13.)
Há, pois, duas espécies de famílias: as famílias pelos laços espirituais e as famílias pelos laços corporais. Duráveis, as primeiras se fortalecem pela purificação e se perpetuam no mundo dos Espíritos, através das várias migrações da alma; as segundas, frágeis como a matéria, se extinguem com o tempo e muitas vezes se dissolvem moralmente, já na existência atual. Foi o que Jesus quis tornar compreensível, dizendo de seus discípulos: Aqui estão minha mãe e meus irmãos pelos laços do Espírito, pois todo aquele que faz a vontade de meu Pai que está nos céus é meu irmão, minha irmã e minha mãe.” [2]
Carlos Torres Pastorino, analisando o versículo 46 do capítulo 12 do Evangelho segundo Mateus (“Quem é minha mãe, e quem são meus irmãos?”), pondera:
“A pergunta, aparentemente desrespeitosa para com Sua mãe, vem demonstrar que Jesus, em Sua missão, não está preso pelos laços sanguíneos, tão frágeis que só vigoram numa dada encarnação. A família espiritual é muito mais sólida, pois os vínculos são espirituais (sintônicos) e não materiais (sangue e células perecíveis). Jesus não pode subordinar-se às exigências do parentesco terreno, mesmo em se tratando de Sua mãe. Com o olhar benévolo sobre os que O rodeavam, Jesus lança Sua doutrina nítida: o ideal é superior aos laços de sangue; a família espiritual é mais importante que a natural e sobreleva a ela.” [3]
Kardec, no mesmo diapasão, esclarece, no item 18 do Capítulo IV de “O Evangelho Segundo o Espiritismo”:
“No espaço, os Espíritos formam grupos ou famílias entrelaçados pela afeição, pela simpatia e pela semelhança das inclinações. Ditosos por se encontrarem juntos, esses Espíritos se buscam uns aos outros. (...) Se uns encarnam e outros não, nem por isso deixam de estar unidos pelo pensamento.” [4]
Na obra “Entre a Terra e o Céu”, Clarêncio orienta:
“A família espiritual é uma constelação de Inteligências, cujos membros estão na Terra e nos Céus. Aquele que já pode ver mais um pouco auxilia a visão daquele que ainda se encontra em luta por desvencilhar-se da própria cegueira. Todos nós, por mais baixo nos revelemos na escala da evolução, possuímos, não longe de nós, alguém que nos ama a impelir-nos para a elevação. Isso podemos verificar nos círculos da matéria mais densa. Temos constantemente corações que nos devotam estima e se consagram ao nosso bem.” [5]

Foto: Hendrio Belfort

Naturalmente, essas passagens não nos devem jamais levar à conclusão de que a família em que ora encarnamos é de pouca importância. Não nascemos por acaso ou acidente em nenhum círculo familiar. Há pessoas que, em momentos de rebeldia, afirmam que “não pediram para nascer”. Contudo, ainda que não nos lembremos, a maioria da Humanidade terrestre pede novas chances de aprendizado e reparação, dentro de nossas possibilidades de maturidade moral e intelectual. Nascemos onde, quando e com quem precisávamos, como lemos, por exemplo, nas respostas às questões 184, 269, 334, 335, 338, 393, 572, 574, 950 e 986 de “O Livro dos Espíritos”.

Portanto, temos, sim, de investir nosso melhor em nossa família consanguínea, pois certamente temos muito a aprender e muito bem a fazer a esses Espíritos. A lição trazida na passagem evangélica acima citada é que fazemos parte da família das Humanidades, não só de toda a Terra, mas de todo o Universo — e temos o dever de fazer o Bem a todos, a começar pela família que temos em casa, mas não restritos a ela. O Espírito Galileu corrobora essa ideia, no Capítulo VI de “A Gênese”:
“Uma mesma família humana foi criada na universalidade dos mundos e os laços de uma fraternidade que ainda não sabeis apreciar foram postos a esses mundos. Se os astros que se harmonizam em seus vastos sistemas são habitados por inteligências, não o são por seres desconhecidos uns dos outros, mas, ao contrário, por seres que trazem marcado na fronte o mesmo destino, que se hão de encontrar temporariamente, segundo suas funções de vida, e encontrar de novo, segundo suas mútuas simpatias. É a grande família dos Espíritos que povoam as terras celestes; é a grande irradiação do Espírito divino que abrange a extensão dos céus e que permanece como tipo primitivo e final da perfeição espiritual.” [6]
Espíritos de maior elevação moral e intelectual, os quais, por seu empenho no Bem, atingem o direito de viver em mundos mais felizes, não desfazem seus laços de afeição a quem amam e que, temporariamente, seguem vivendo na Terra ou em outros mundos de Espíritos em etapas evolutivas anteriores. Observemos o exemplo do Espírito denominado Samuel Filipe, pessoa sempre empenhada em fazer o melhor por seu semelhante, o que o qualificou a fazer uma transição tranquila para o mundo espiritual. Questionado sobre o local onde habitara quando evocado e sobre sua lembrança de seus entes queridos, assim argumentou:
“P. Esse mundo tão novo e comparado ao qual nada vale o nosso, bem como os numerosos amigos que nele reencontrastes, fizeram-vos esquecer a família e amigos encarnados?
— R. Se os tivesse esquecido seria indigno da felicidade de que gozo. Deus não recompensa o egoísmo, pune-o. O mundo em que me vejo pode fazer com que desdenhe a Terra, mas não os Espíritos nela encarnados. Somente entre os homens é que a prosperidade faz esquecer os companheiros de infortúnio. Muitas vezes venho visitar os que me são caros, exultando com a recordação que de mim guardaram; assisto às suas diversões, e, atraído por seus pensamentos, gozo se gozam ou sofro se sofrem.” [7]
A Terra, apesar de ainda estar longe da condição de mundo feliz, vem demonstrando constante evolução. Kardec comenta a esse respeito em “A Gênese”, lançado em 06 de janeiro de 1868, já observando, há quase 143 anos, movimentos mais comumente divulgados nos dias atuais:
“Hoje, a Humanidade está madura para lançar o olhar a alturas que nunca tentou divisar, a fim de nutrir-se de ideias mais amplas e compreender o que antes não compreendia. (...)
Essa fase já se revela por sinais inequívocos, por tentativas de reformas úteis e que começam a encontrar eco. Assim é que vemos fundar-se uma imensidade de instituições protetoras, civilizadoras e emancipadoras, sob o influxo e por iniciativa de homens evidentemente predestinados à obra da regeneração; que as leis penais se vão apresentando dia a dia impregnadas de sentimentos mais humanos. Enfraquecem-se os preconceitos de raça, os povos entram a considerar-se membros de uma grande família; pela uniformidade e facilidade dos meios de realizarem suas transações, eles suprimem as barreiras que os separavam e de todos os pontos do mundo reúnem-se em comícios universais, para as justas pacíficas da inteligência.
Falta, porém, a essas reformas uma base que permita se desenvolvam, completem e consolidem; falta uma predisposição moral mais generalizada, para fazer que elas frutifiquem e que as massas as acolham. Ainda aí há um sinal característico da época, porque há o prelúdio do que se efetuará em mais larga escala, à proporção que o terreno se for tornando mais favorável.” [8]
Ao estudarmos as palavras de Jesus, assim como analisando, pela História, a redução das fronteiras entre os povos, bem como estudando, pela Física, a interligação de todos pelo Fluido Universal, sempre chegamos à mesma conclusão: todos somos filhos do mesmo Criador, e, portanto, uma única família, à qual nos compete auxiliar levando todo o Bem que sabemos praticar, e aprendendo para praticar todo o Bem que ainda nos caiba aprender.



Referências:

[1] HOLANDA, Aurélio Buarque de. “Novo Dicionário Eletrônico Aurélio”. Versão 5.0 de 2004. Positivo Informática. Família.
[2] KARDEC, Allan. “O Evangelho Segundo o Espiritismo”. 97.ed. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 1987. Capítulo XIV, item 8.
[3] PASTORINO, Carlos Torres. “Sabedoria do Evangelho”. Rio de Janeiro, RJ: Sabedoria, 1964. Volume 3. A Família de Jesus.
[4] KARDEC, Allan. “O Evangelho Segundo o Espiritismo”. 97.ed. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 1987. Capítulo IV, item 18.
[5] XAVIER, Francisco Cândido. “Entre a Terra e o Céu”. 17.ed. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 1997. Cap. 33.
[6] KARDEC, Allan. “A Gênese”. 34.ed. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 1991. Capítulo VI, item 56.
[7] KARDEC, Allan. “O Céu e o Inferno”. 37.ed. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 1991. Segunda parte, Capítulo II. Samuel Filipe.
[8] KARDEC, Allan. “A Gênese”. 34.ed. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 1991. Capítulo XVIII, itens 20 e 21.